cancelamento: Nova Terminologia ou Velhos Comportamentos?
Por não ter vivenciado a era das redes sociais como Orkut, Facebook ou TikTok, exceto pelo WhatsApp, que me conecta gratuitamente ao mundo, demorei para entender expressões como “cancelei”, “fui cancelado” e “vou cancelar”. Conhecidos como cultura do cancelamento, essas frases indicam um fenômeno que, ao meu ver, não traz nada de novo.
Na minha juventude, usávamos termos como intriga ou desavença. Quando alguém decidia cortar relações, dizia coisas como: “me intriguei com fulano” ou “estou de mal com ele”. Embora a situação não fosse divulgada online, todos os envolvidos percebiam a perda de um amigo ou conhecido, mesmo que não fossem íntimos. Essa desconexão persistia até que um dos dois tomasse a iniciativa de se reconciliar, muitas vezes com um gesto de humildade.
Talvez a idade alimente conflitos geracionais, mas não consigo entender a necessidade de declarar publicamente o cancelamento de alguém que a pessoa decidiu seguir nas redes sociais. Parece ser uma busca por protagonismo, uma tentativa de ganhar notoriedade às custas do outro, que muitas vezes nem se dá conta da situação.
Outro aspecto intrigante dessa nova dinâmica é a reinterpretação de comportamentos antigos. Antigos caluniadores, difamadores e maledicentes agora são rotulados como “haters”. Na visão de um amigo, isso é apenas uma trivialidade de um mundo subdesenvolvido, ou como ele ironicamente comenta, uma manifestação do “Can’s Turner Complex”.
O que mais me surpreende é o número crescente de influenciadores que, mesmo sem conteúdo significativo, atraem milhares de seguidores. Certamente, existem pessoas sérias e competentes por trás de alguns perfis, mas, segundo meu amigo observador, a maioria sobrevive à custa do que ele chama de “idioters”.
Recentemente, conversei com jovens na faixa dos 20 aos 30 anos que são entusiastas do TikTok. Para minha surpresa, nenhum deles conhecia figuras icônicas como Ângela Maria, Cauby Peixoto ou Grande Otelo. Autores renomados como Jorge Amado e Érico Verissimo também estavam fora do radar deles. Quando questionei sobre figuras históricas como Napoleão Bonaparte ou a Princesa Isabel, todos afirmaram conhecê-los, mesmo que tivessem falecido antes do nascimento deles. Essa contradição gerou um silêncio constrangedor, seguido de uma rápida saída do grupo.
Antes que me chamem de velho ranzinza, quero enfatizar que a minha opinião ecoa o alerta do respeitado escritor e filósofo Umberto Eco, que afirmou que a internet deu voz a um bando de imbecis. É verdade que essa visão se aplica a uma minoria barulhenta nas redes sociais, mas é um grupo que parece crescer em número e influência.
Refletindo sobre tudo isso, talvez o melhor a fazer seja ignorar essas modernidades e abraçar minha identidade como alguém de outra geração, reconhecendo que nem todos os avanços tecnológicos são necessariamente benéficos.
Rio, 2025