Incertezas em Arraial do Cabo
Mais de 800 pessoas residentes nos bairros Caiçara e Sabiá, em Arraial do Cabo, estão em estado de alerta devido à possibilidade de perder suas casas. Isso se deve a ordens judiciais relacionadas a ações de reintegração de posse e demolições, que visam a construção de empreendimentos privados e intervenções em áreas de preservação ambiental. Esses casos revelam a fragilidade das políticas públicas de habitação e a falta de assistência a comunidades vulneráveis.
No bairro Caiçara, uma ordem de reintegração de posse foi emitida em 8 de julho de 2025, estabelecendo um prazo de 60 dias para desocupação. A decisão judicial, assinada pelo juiz José Renato Oliva de Mattos Filho, referencia o processo nº 0006357-49.2018.8.19.0005 e determina a devolução da área, que está situada às margens da RJ-102, ao autor da ação, um empreendimento privado. Moradores da região afirmam que já se passaram mais de metade do prazo e, até agora, nenhuma notificação pessoal foi entregue. Apenas uma placa informativa foi instalada na entrada do bairro.
“Colocaram uma placa e estão se preparando para demolir nossas casas sem nos avisar. Não tivemos tempo para retirar nossos pertences, nenhum tipo de alternativa de moradia foi oferecida, nada. Isso é desumano”, desabafa uma moradora.
Leia também: Justiça Eleitoral Isenta Prefeito de Búzios em Acusação Relacionada à Semana Gospel 2024
Com muitas famílias residindo na área há mais de 20 anos, pagando IPTU e construindo suas casas com recursos próprios, a decisão judicial, que se baseia nos artigos 562 e 297 do Código de Processo Civil, pode deixar centenas de pessoas sem abrigo e sem qualquer tipo de apoio social.
Desafios no Bairro Sabiá
A situação no Sabiá, que é o bairro vizinho, também é complicada, mas fundamentada em uma base jurídica diferente. Na terça-feira, dia 5, agentes do Instituto Estadual do Ambiente (INEA) e do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) estiveram presentes na localidade para notificar moradores cujas residências estão dentro da área do Parque Estadual da APA da Massambaba. Nesse caso, a ação se refere não à reintegração de posse, mas à demolição de construções em áreas de proteção ambiental.
Leia também: Justiça Eleitoral Isenta Prefeito de Búzios em Acusação Relacionada à Semana Gospel 2024
Diferentemente do que ocorre no Caiçara, os moradores do Sabiá estão recebendo notificações formais. No entanto, ainda expressam preocupação com a falta de diálogo com as autoridades competentes e temem a perda súbita de suas casas. A ocupação no Sabiá, de acordo com relatos, é mais extensa e estruturada, o que pode estar levando a uma ação mais rápida das autoridades ambientais.
“O que se questiona é: o que fazer com essas pessoas? Muitos estão ali há anos e, do nada, serão retirados. Quem tem para onde ir não enfrenta problemas, mas aqueles sem alternativa, como ficam, especialmente com crianças? Antes de chegar ao ponto de derrubar, deveria haver uma alternativa, como programas habitacionais que ajudassem quem realmente não tem para onde ir. O dinheiro existe, o que falta é sensibilidade”, comentou um internauta.
Na última sexta-feira, dia 1, os moradores do Caiçara realizaram uma manifestação pacífica pedindo respeito e dignidade de forma organizada. Com faixas, cartazes e relatos emocionantes, os participantes exigiram a presença das autoridades públicas. “A Prefeitura só aparece aqui na época de eleições. Agora que mais precisamos, ninguém aparece”, lamentou um dos moradores.
“São 400 famílias, quase 800 pessoas, incluindo crianças, jovens, adultos, deficientes físicos e intelectuais, idosos e acamados; todos foram surpreendidos por uma notificação de decisão judicial exigindo que desocupem suas casas, pois serão demolidas em 90 dias! Sem aviso prévio, sem comunicação do poder público municipal e seus representantes. Muitos ainda têm documentos de compra de imóveis e terrenos, IPTU, água, luz, internet e outros serviços essenciais. Todos estão pedindo SOCORRO!”, acrescentou uma internauta.
A reportagem procurou a Prefeitura de Arraial do Cabo para indagar sobre a existência de programas habitacionais ou medidas de apoio às famílias afetadas, mas não obteve resposta até o fechamento deste texto. O MPRJ também foi questionado sobre as ações em ambos os bairros, sem retorno até a publicação. O INEA, por sua vez, divulgou uma nota informando que está acompanhando o processo conduzido pelo Ministério Público e que auxiliará nas medidas necessárias para o cumprimento da decisão judicial, considerando que as construções estão dentro de uma unidade de conservação estadual.