Patrimônio em Risco
Um dos prédios históricos mais emblemáticos de Cabo Frio está à beira da demolição. Após a polêmica eliminação do Galpão do Sal em 2021, agora é a vez da Casa do professor Edilson Duarte, localizada na Avenida Teixeira e Souza. Nesta segunda-feira (25), o Conselho Municipal do Patrimônio Cultural (CMUPAC) decidiu pelo arquivamento do processo de tombamento desse imóvel, o que abre caminho para sua destruição.
O pedido para preservar a Casa Edilson Duarte foi formalizado em julho de 2024 sob o número de processo 2024/27555. Na documentação, o então secretário municipal de cultura, Márcio Lima Sampaio, mencionou que o pedido de tombamento foi registrado em ata durante uma reunião do CMUPAC no dia 25 de julho. Na época, Sérgio Nogueira presidia o órgão, sendo atualmente diretor do Imupac. Curiosamente, foram os conselheiros da nova gestão que afirmaram que Sérgio, por sua vez, foi quem solicitou o arquivamento do processo, além da demolição do imóvel. A Folha tentou contato com Nogueira, mas não obteve resposta.
A Casa Edilson Duarte é uma construção térrea que remete ao início do século XX e é reconhecida por sua importância histórica, cultural e paisagística. O imóvel pertenceu a Edilson Duarte, um respeitado educador, advogado e ex-prefeito de Cabo Frio, além de cronista e presidente do Tamoyo Esporte Clube.
Decisão Controversa e Reações
A aprovação do arquivamento do pedido de tombamento foi realizada com os votos favoráveis do governo municipal, que contou com o apoio das secretarias de Gestão Territorial, Economia Azul, Turismo, Igualdade Racial, cultura e Procuradoria, além da Câmara de Vereadores. Em contrapartida, órgãos técnicos do Conselho, como Iphan, Inepac e Uenf, se opuseram à decisão. O Coletivo Griot, que também faz parte do CMUPAC, absteve-se da votação, e a Asaerla, que ocupa a presidência do órgão, só vota em caso de empate. O Ibram não compareceu à reunião, o que gerou reações imediatas na comunidade.
Lucas Muller, integrante da ONG Cabo Frio Solidária e ex-vice-presidente do CMUPAC, expressou preocupação com a votação, ressaltando que ela revela fragilidades no colegiado. “Defendemos que se faça um estudo mais aprofundado”, afirmou.
Em entrevista à Folha, Carina Mendes, doutora em arquitetura e urbanismo e chefe do escritório técnico do Iphan, criticou a decisão do CMUPAC. Para ela, a demolição da Casa Edilson Duarte foi precipitada e deveria ser analisada com mais cuidado. “É necessário repensar o papel do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural”, disse.
A Relevância do Imóvel e Impressões do Iphan
Questionada sobre a fundamentação técnica utilizada pelo Iphan para recomendar o tombamento da casa, Carina destacou que a proposta é realizar um estudo mais detalhado sobre o imóvel. “Defendemos que o discurso da simplicidade não sirva como justificativa para desmerecer a relevância do prédio, pois muitas vezes a arquitetura mais modesta é histórica e socialmente significativa”, esclareceu.
Ao ser indagada sobre a importância do imóvel para a memória de Cabo Frio, Carina argumentou que ele deve ser analisado dentro do contexto da produção residencial arquitetônica do século XX. “Um olhar mais atento é fundamental para identificar quais exemplares dessa produção ainda devem ser preservados”, acrescentou.
Sobre os riscos de decisões políticas sobrepondo as técnicas em órgãos como o CMUPAC, Carina expressou sua preocupação. “Não se trata apenas de priorizar a decisão técnica, mas sim garantir que o Conselho tenha sensibilidade ao tema e esteja atento às transformações locais”, enfatizou.
Se a demolição for autorizada, Cabo Frio perderá uma parte significativa de sua identidade cultural e histórica, conforme Carina explicou: “Isso significa perder a chance de preservar a arquitetura local, que inclui não só os materiais e estilos, mas também a relação do imóvel com o terreno, a rua e o espaço urbano.”
Por fim, questionada sobre se o Iphan poderia tomar medidas administrativas ou judiciais para reverter a decisão, Carina esclareceu que não é possível, pois o Iphan já se manifestou no âmbito do Conselho. “Não existe a possibilidade de avaliação do imóvel em instâncias superiores fora do Conselho Municipal”, concluiu.